Notícia no Ato

Abril Azul – Câmara de Vereadores promove sessão especial sobre o autismo

“Eu sou singular, eu sou novo

Eu gostaria de saber se você é também

Eu ouço vozes no ar

Eu vejo que você não, e isso não parece justo

Eu gostaria de não me sentir triste

Eu sou singular, eu sou novo

Eu finjo que você também é

Eu me sinto como um menino no espaço sideral

Eu toco as estrelas e me sinto fora de lugar

Eu me preocupo com o que os outros podem pensar

Eu choro quando as pessoas riem, isso me faz encolher

Eu sou singular, eu sou novo

Eu entendo agora que você também é

Eu digo ‘Eu me sinto como um rejeitado’

Eu sonho com o dia em que isso será ok

Eu tento me encaixar

Eu espero conseguir um dia

Eu sou singular, eu sou novo”

Com este poema escrito por Benjamin Giroux, um menino de dez anos, portador da Síndrome de Asperger (um dos níveis do espectro autista), o vereador Bruno Hartmann (PSDB) iniciou a sessão especial que trouxe o tema do autismo à luz do conhecimento para a sociedade lageana. A reunião aconteceu no dia 27 de abril, na Câmara de Vereadores, e contou com a participação de entidades do poder público, militantes da causa, familiares e portadores do Transtorno do Espectro Autista (TEA).

Proponente da sessão, Bruno ressaltou que o autismo é um assunto que não tem um mês específico, mas é algo tratado e vivenciado todos os dias. Ele falou sobre a emenda à lei, proposta por ele, que visa garantir atendimento preferencial aos familiares das pessoas que sofrem do transtorno autista. “Uma gestante, lactante, um deficiente físico não vai ter uma crise de hiperatividade, de grito, então já é razão suficiente para justificar a prioridade em cima da prioridade. (…) Nosso mundo está clamando por mais amor, mais respeito, mais inclusão e menos preconceito. Os autistas não precisam nos entender, mas nós sim, entender e acima de tudo respeitar os autistas”, enfatizou o vereador.

Secretário municipal da Assistência Social e Habitação, Samuel Ramos parabenizou o trabalho realizado nesta causa pelos vereadores. Sobre as carteirinhas, disse não ser possível fazer via Assistência Social já que isto é viabilizado através do CadÚnico, da baixa renda, s[o que muitas famílias de pessoas com autismo tem renda superior aos requisitos deste cadastro. No entanto, Samuel se prontificou a disponibilizar uma equipe para atender estas famílias e encaminhar um laudo social via Secretaria de Saúde para a emissão destas carteirinhas.

Educação em Lages fornece atendimento especializado

A reunião no Plenário Nereu Ramos trouxe à mesa de discussões autoridades ligadas à área de Educação Especial, caso da coordenadora Lúcia Burigo de Sousa, da Secretaria Municipal de Educação, e da integradora da Fundação Catarinense de Educação Especial, Alcionir do Nascimento. Também a psicóloga do Centro Especializado em Reabilitação (CER II) da Uniplac e coordenadora do Grupo de Familiares de Pessoas com Autismo, Vivian Fátima de Oliveira; a coordenadora pedagógica do grupo do TEA na Apae, Eliana Palhano de Souza; e a médica e mãe de uma criança autista, Vanessa Telles Souto.

O município de Lages está desde 2008 de acordo com a Política Nacional de Educação quanto ao aspecto da perspectiva inclusiva. Orienta alunos e professores a suplementar a aprendizagem dos alunos com deficiência, com vistas à autonomia e a independência destes na sociedade. Conta com 16 salas de Atendimento Educacional Especializado (AEE), os quais são polos regionais. Em Lages são 227 alunos da Educação Especial, sendo 31 portadores do Transtorno do Espectro Autista.

Os trabalhos contam com o apoio do Governo do Estado, através da Fundação Catarinense de Educação Especial. Primeira entidade pública instituída com este propósito, no ano de 1968, a FCEE atende perto de 18 mil alunos em todo o estado, cedendo profissionais especializados para mais de 200 instituições. Em Lages, escolas e entidades como a Adevips (Deficientes Visuais), APAS (Deficientes Auditivos), Apae (Excepcionais) são agraciadas com professores, intérpretes, instrutores, entre outros profissionais que são custeados pelo governo estadual. São atendidos 1.196 alunos autistas em Santa Catarina. Entretanto, esse número pode ser maior, já que muitos familiares e escolas ainda não enviaram a solicitação à FCEE para este auxílio à aprendizagem.

Autistas são pessoas voltadas a si mesmas

A psicóloga Vivian Fátima de Oliveira apresentou linhas gerais sobre o tema, cujo pioneiro no estudo foi o psiquiatra austríaco Leo Kanner. “O autismo é um quebra-cabeça. Ainda não existe uma causa, não se encontrou um marcador biológico que defina o autismo”, apontou a psicóloga. Ela apontou três níveis dentro do Espectro Autista, variáveis de um apoio substancial ao portador (o qual é geralmente é retratado em novelas e filmes) até o nível 3, de muito apoio.

O maior problema enfrentado por quem convive com o autismo é a comunicação. Muitos não conseguem se comunicar verbalmente, só através do comportamento, mas mesmo estes são carregados de muitas particularidades uma vez que nove entre dez pessoas autistas apresentam alterações sensoriais. “Uma luz incandescente ou um barulho, que talvez não nos incomode tanto, pode ser sinônimo de crise para eles. Por isso, a necessidade das famílias terem a opção de atendimento preferencial, porque só pela pessoa esperar em um ambiente público já pode gerar uma crise”, explicou Oliveira, que ressalta que os portadores mais necessitam é de uma Acessibilidade Atitudinal, uma mudança nas atitudes humanas, de pensamento, culturas e valores das pessoas.

O apoio aos familiares é realizado também por iniciativas individuais e/ou coletivas, como a do curso de Psicologia da Uniplac, que através do Centro Especializado em Reabilitação promove encontros semanais todas as terças-feiras, às 14h30, no Centro da Saúde de referida universidade.

Familiares e autistas se fizeram presentes na sessão

O Plenário Nereu Ramos da Câmara esteve um tanto quanto descontraído com a presença das crianças e adolescentes autistas, que circulavam curiosas pelo ambiente. A médica Vanessa Souza, mãe de Lucas, autista, com seis anos de idade, deu seu depoimento sobre a situação. Confira:

“Os primeiros sinais do autismo apareceram quando Lucas tinha um ano e três meses, sinais sutis, despercebidos para as pessoas mais próximas, que depois foram se tornando mais significativos. Ele demorou a falar, não apresentava contato visual, audição seletiva. Risos inapropriados, caminhava de um lado a outro. Vários exames foram feitos, tudo normal, o que afastou outros diagnósticos. Foi quando se constatou o TEA. Quando se tem um diagnostico, é um ponto de partida para se seguir. Daquele momento em diante nossa vida mudou radicalmente. Foram semanas de terapia, nos quais, nós, pais, participamos ativamente sobre as formas de como intervir e melhorar a qualidade de vida do nosso filho. Depois disso, ele teve uma rotina de atividades em casa. Não somente na terapia e nas escolas. Vestir e tirar a roupa, abrir e fechar a torneira, soltar a descarga após usar o banheiro. Coisas simples, que qualquer um faz pelo seu filho, e que entendíamos que ele deveria fazer. Se nós o tivéssemos tratado como um coitadinho, ele não teria estes avanços. Com dois anos ele já sabia as formas de alfabeto, números, em inglês e português, mesmo sem verbalizar. Sabíamos que ele não tinha déficit intelectual, e os estímulos foram essenciais para a evolução do quadro, muitas destas atividades eram feitas com muita paciência e aguardo. Hoje Lucas ouve música e se diverte conosco, gosta de rock’n’roll e sertanejo, e cursa a primeira série de uma escola fundamental em Cerro Negro. Que isso sirva de afago e estímulo às demais famílias, não sei se o Lucas terá condições de entrar em uma universidade, mas farei de tudo para que ele tenha uma vida o mais independente e feliz possível”, contou uma emocionada mãe.

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